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domingo, 10 de abril de 2011

As 95 Teses de Martin Lutero



Essas teses foram afixadas na porta da Igreja do Castelo de Wittenberg a 1o de outubro de 1517. Era esse o modo usual de se anunciar uma “disputa”, prática regular da vida universitária. Ao fazer isso, não havia nada de excepcional na atitude de Lutero(1483-1546), pois apenas agia conforme costumes medievais ainda presentes nas universidades européias. Não se tratava de uma ação que deveria ter uma conotação individual, visto que as disputas eram debates que envolviam professores e estudantes, daí o fato de Lutero pedir para aqueles que não pudessem se fazer presentes às disputas que, ao menos, enviassem suas opiniões por escrito para serem lidas. Portanto, as “teses” deveriam ser vistas como “pontos a serem debatidos” em uma plenária. Nesse sentido, trata-se de um ato público envolvendo doutos e/ou seus estudantes, como demonstra o fato de as teses terem sido escritas originalmente em latim e não em alemão (língua familiar de Lutero). Observe-se também que o tom irônico e uma certa preocupação com métrica e rima fazem parte do ritual de “belo discurso”(arte da retórica), matéria obrigatória nas universidades da época.
Portanto, ao lançar suas “95 Teses”, Lutero tornava públicas e não populares as suas idéias, com a finalidade de expor questões que o incomodavam a respeito das “vendas de perdão/indulgências”, cujas contradições práticas e doutrinais, somadas à corrupção de determinados setores do clero, eram vistas por ele como uma ameaça à credibilidade em relação à fé cristã e à Igreja de Roma. Isso significa que, ao tornar públicas suas teses, Lutero esperava receber o apoio do papa e não a sua censura. No entanto, depois de novas disputas teológicas, desta vez com agentes enviados pelo Papa Leão X(1475-1521; pontificado: 1513-1521), foi redigida contra Lutero uma carta de excomunhão datada em 21 de janeiro de 1521, que ele receberia meses depois.
Entre 1517 e 1521, Lutero foi submetido a algumas disputas teológicas e quase metade de suas teses foi refutada pelos agentes teológicos do papa. Aos poucos, a situação fugiu dos muros da universidade, e muitas idéias de Lutero foram convenientemente distorcidas por membros da nobreza alemã, que utilizaram a “desculpa da fé” para tomar bens e terras de famílias inimigas e da própria Igreja. Toda esta situação foi consolidando uma situação de cisma religioso na Europa que estava longe das intenções de Lutero. Portanto, deve-se entender que a ação de Lutero misturou-se involuntariamente com interesses políticos e outras tendências do debate teológico que remontavam ao século XIII.
Por isso, ele criticou tanto as revoltas camponesas (marcadamente anabatistas) quanto os nobres que misturavam o plano religioso com o secular. Inserido numa realidade mental de Antigo Regime, Lutero era muito cioso das hierarquias sociais e criticava a nobreza e parte do clero que não davam “bom exemplo” e, explorando os camponeses com tributações extraordinárias, alimentavam as suas revoltas. Assim, não surpreende que em 1520 tenha escrito “Apelo à Nobreza Germânica” e, em 1525, no contexto das guerras camponesas ocorridas na Alemanha, tenha escrito “Sobre a Autoridade Secular”, que tinham um teor claramente secularizaste e favorável ao equilíbrio dos diretos e responsabilidades que justificavam, aos seus olhos, as hierarquias sociais.
Portanto, frente a um mundo que se apresentava instável e inseguro, Lutero apelava para dispositivos tradicionais como meio de restaurar a segurança do mundo, mas com uma novidade que jamais foi praticada plenamente em parte nenhuma da Europa até o final do Antigo Regime: apenas quem julga a fé é Deus e, portanto, nenhuma autoridade política deve, em nome dela, causar desperdício de vida e bens de seus subordinados políticos.

Latim
Português
Amore et studio elucidande veritatis hec subscripta disputabuntur Wittenberge, Presidente R. P. Martino Lutther, Artium et S. Theologie Magistro eiusdemque ibidem lectore Ordinario. Quare petit, ut qui non possunt verbis presentes nobiscum disceptare agant id literis absentes.
In nomine domini nostri Hiesu Christi.
Amen.
Com um desejo ardente de trazer a verdade à luz, as seguintes teses serão defendidas em Wittenberg sob a presidência do Rev. Frei Martinho Lutero, Mestre de Artes, Mestre de Sagrada Teologia e Professor oficial da mesma. Ele, portanto, pede que todos os que não puderem estar presentes e disputar com ele verbalmente, façam-no por escrito.
Em nome de Nosso Senhor Jesus Cristo.
Amém.
1. Dominus et magister noster Iesus Christus dicendo ‘Penitentiam agite &c.’ omnem vitam fidelium penitentiam esse voluit.
1. Ao dizer: "Fazei penitência", etc. [Mt 4.17], o nosso Senhor e Mestre Jesus Cristo quis que toda a vida dos fiéis fosse penitência.
2. Quod verbum de penitentia sacramentali (id est confessionis et satisfactionis, que sacerdotum ministerio celebratur) non potest intelligi.
2. Esta penitência não pode ser entendida como penitência sacramental (isto é, da confissão e satisfação celebrada pelo ministério dos sacerdotes).
3. Non tamen solam intendit interiorem, immo interior nulla est, nisi foris operetur varias carnis mortificationes.
3. No entanto, ela não se refere apenas a uma penitência interior; sim, a penitência interior seria nula se, externamente, não produzisse toda sorte de mortificação da carne.
4. Manet itaque pena, donec manet odium sui (id est penitentia vera intus), scilicet usque ad introitum regni celorum.
4. Por conseqüência, a pena perdura enquanto persiste o ódio de si mesmo (isto é a verdadeira penitência interior), ou seja, até a entrada do reino dos céus.
5. Papa non vult nec potest ullas penas remittere preter eas, quas arbitrio vel suo vel canonum imposuit.
5. O papa não quer nem pode dispensar de quaisquer penas senão daquelas que impôs por decisão própria ou dos cânones.
6. Papa non potest remittere ullam culpam nisi declarando, et approbando remissam a deo Aut certe remittendo casus reservatos sibi, quibus contemptis culpa prorsus remaneret.
6. O papa não tem o poder de perdoar culpa a não ser declarando ou confirmando que ela foi perdoada por Deus; ou, certamente, perdoados os casos que lhe são reservados. Se ele deixasse de observar essas limitações, a culpa permaneceria.
7. Nulli prorus remittit deus culpam, quin simul eum subiiciat humiliatum in omnibus sacerdoti suo vicario.
7. Deus não perdoa a culpa de qualquer pessoa sem, ao mesmo tempo, sujeitá-la, em tudo humilhada, ao sacerdote, seu vigário.
8. Canones penitentiales solum viventibus sunt impositi nihilque morituris secundum eosdem debet imponi.
8. Os cânones penitenciais são impostos apenas aos vivos; segundo os mesmos cânones, nada deve ser imposto aos moribundos.
9. Inde bene nobis facit spiritussanctus in papa excipiendo in suis decretis semper articulum mortis et necessitatis.
9. Por isso, o Espírito Santo nos beneficia através do papa quando este, em seus decretos, sempre exclui a circunstância da morte e da necessidade.
10. Indocte et male faciunt sacerdotes ii, qui morituris penitentias canonicas in purgatorium reservant.
10. Agem mal e sem conhecimento de causa aqueles sacerdotes que reservam aos moribundos penitências canônicas para o purgatório.
11. Zizania illa de mutanda pena Canonica in penam purgatorii videntur certe dormientibus episcopis seminata.
11. Essa cizânia de transformar a pena canônica em pena do purgatório parece ter sido semeada enquanto os bispos certamente dormiam.
12. Olim pene canonice non post, sed ante absolutionem imponebantur tanquam tentamenta vere contritionis.
12. Antigamente se impunham as penas canônicas não depois, mas antes da absolvição, como verificação da verdadeira contrição.
13. Morituri per mortem omnia solvunt et legibus canonum mortui iam sunt, habentes iure earum relaxationem.
13. Através da morte, os moribundos pagam tudo e já estão mortos para as leis canônicas, tendo, por direito, isenção das mesmas.
14. Imperfecta sanitas seu charitas morituri necessario secum fert magnum timorem, tantoque maiorem, quanto minor fuerit ipsa.
14. Saúde ou amor imperfeito no moribundo necessariamente traz consigo grande temor, e tanto mais quanto menor for o amor.
15. Hic timor et horror satis est se solo (ut alia taceam) facere penam purgatorii, cum sit proximus desperationis horrori.
15. Este temor e horror por si sós já bastam (para não falar de outras coisas) para produzir a pena do purgatório, uma vez que estão próximos do horror do desespero.
16. Videntur infernus, purgaturium, celum differre, sicut desperatio, prope desperatio, securitas differunt.
16. Inferno, purgatório e céu parecem diferir da mesma forma que o desespero, o semidesespero e a segurança.
17. Necessarium videtur animabus in purgatorio sicut minni horrorem ita augeri charitatem.
17. Parece desnecessário, para as almas no purgatório, que o horror diminua na medida em que cresce o amor.
18. Nec probatum videtur ullis aut rationibus aut scripturis, quod sint extra statum meriti seu augende charitatis.
18. Parece não ter sido provado, nem por meio de argumentos racionais nem da Escritura, que elas se encontrem fora do estado de mérito ou de crescimento no amor.
19. Nec hoc probatum esse videtur, quod sint de sua beatitudine certe et secure, saltem omnes, licet nos certissimi simus.
19. Também parece não ter sido provado que as almas no purgatório estejam certas de sua bem-aventurança, ao menos não todas, mesmo que nós, de nossa parte, tenhamos plena certeza disso.
20. Igitur papa per remissionem plenariam omnium penarum non simpliciter omnium intelligit, sed a seipso tantummodo impositarum.
20. Portanto, por remissão plena de todas as penas, o papa não entende simplesmente todas, mas somente aquelas que ele mesmo impôs.
21. Errant itaque indulgentiarum predicatores ii, qui dicunt per pape indulgentias hominem ab omni pena solvi et salvari.
21. Erram, portanto, os pregadores de indulgências que afirmam que a pessoa é absolvida de toda pena e salva pelas indulgências do papa.
22. Quin nullam remittit animabus in purgatorio, quam in hac vita  debuissent secundum Canones solvere.
22. Com efeito, ele não dispensa as almas no purgatório de uma única pena que, segundo os cânones, elas deveriam ter pago nesta vida.
23. Si remissio ulla omnium omnino penarum potest alicui dari, certum est eam non nisi perfectissimis, i.e. paucissimis, dari.
23. Se é que se pode dar algum perdão de todas as penas a alguém, ele, certamente, só é dado aos mais perfeitos, isto é, pouquíssimos.
24. Falli ob id necesse est maiorem partem populi per indifferentem illam et magnificam pene solute promissionem.
24. Por isso, a maior parte do povo está sendo necessariamente ludibriada por essa magnífica e indistinta promessa de absolvição da pena.
25.Qualem potestatem habet papa in purgatorium generaliter, talem habet quilibet Episcopus et Curatus in sua diocesi et parochia specialiter.
25. O mesmo poder que o papa tem sobre o purgatório de modo geral, qualquer bispo e cura tem em sua diocese e paróquia em particular.
[26] Optime facit papa, quod non potestate clavis (quam nullam habet) sed per modum suffragii dat animabus remissionem.
26. O papa faz muito bem ao dar remissão às almas não pelo poder das chaves (que ele não tem), mas por meio de intercessão.
[27] Hominem predicant, qui statim ut iactus nummus in cistam tinnierit evolare dicunt animam.
27. Pregam doutrina humana os que dizem que, tão logo tilintar a moeda lançada na caixa, a alma sairá voando [do purgatório para o céu].
[28] Certum est, nummo in cistam tinniente augeri questum et avariciam posse: suffragium autem ecclesie est in arbitrio dei solius.
28. Certo é que, ao tilintar a moeda na caixa[1] [1] , pode aumentar o lucro e a cobiça; a intercessão da Igreja, porém, depende apenas da vontade de Deus.
[29] Quis scit, si omnes anime in purgatorio velint redimi, sicut de s. Severino et Paschali factum narratur.
29. E quem é que sabe se todas as almas no purgatório querem ser resgatadas, como na história contada a respeito de São Severino e São Pascoal?
[30] Nullus securus est de veritate sue contritionis, multominus de consecutione plenarie remissionis.
30. Ninguém tem certeza da veracidade de sua contrição, muito menos de haver conseguido plena remissão.
[31] Quam rarus est vere penitens, tam rarus est vere indulgentias redimens, i. e. rarissimus.
31. Tão raro como quem é penitente de verdade é quem adquire autenticamente as indulgências, ou seja, é raríssimo.
[32] Damnabuntur ineternum cum suis magistris, qui per literas veniarum securos sese credunt de sua salute.
32. Serão condenados em eternidade, juntamente com seus mestres, aqueles que se julgam seguros de sua salvação através de carta de indulgência.
[33] Cavendi sunt nimis, qui dicunt venias illas Pape donum esse illud dei inestimabile, quo reconciliatur homo deo.
33. Deve-se ter muita cautela com aqueles que dizem serem as indulgências do papa aquela inestimável dádiva de Deus através da qual a pessoa é reconciliada com Ele.
[34] Gratie enim ille veniales tantum respiciunt penas satisfactionis sacramentalis ab homine constitutas.
34. Pois aquelas graças das indulgências se referem somente às penas de satisfação sacramental, determinadas por seres humanos.
[35] Non christiana predicant, qui docent, quod redempturis animas vel confessionalia non sit necessaria contritio.
35. Os que ensinam que a contrição não é necessária para obter redenção ou indulgência, estão pregando doutrinas incompatíveis com o cristão.
[36] Quilibet christianus vere compunctus habet remissionem plenariam a pena et culpa etiam sine literis veniarum sibi debitam.
36. Qualquer cristão que está verdadeiramente contrito tem remissão plena tanto da pena como da culpa, que são suas dívidas, mesmo sem uma carta de indulgência.
[37] Quilibet versus christianus, sive vivus sive mortuus, habet participationem omnium bonorum Christi et Ecclesie etiam sine literis veniarum a deo sibi datam.
37. Qualquer cristão verdadeiro, vivo ou morto, participa de todos os benefícios de Cristo e da Igreja, que são dons de Deus, mesmo sem carta de indulgência.
[38] Remissio tamen et participatio Pape nullo modo est contemnenda, quia (ut dixi) est declaratio remissionis divine.
38. Contudo, o perdão distribuído pelo papa não deve ser desprezado, pois – como disse – é uma declaração da remissão divina[2] [2] .
[39] Difficillimum est etiam doctissimis Theologis simul extollere veniarum largitatem et contritionis veritatem coram populo.
39. Até mesmo para os mais doutos teólogos é dificílimo exaltar simultaneamente perante o povo a liberalidade de indulgências e a verdadeira contrição.[3] [3]
[40] Contritionis veritas penas querit et amat, Veniarum autem largitas relaxat et odisse facit, saltem occasione.
40. A verdadeira contrição procura e ama as penas, ao passo que a abundância das indulgências as afrouxa e faz odiá-las, ou pelo menos dá ocasião para tanto.[4][4]
[41] Caute sunt venie apostolice predicande, ne populus false intelligat eas preferri ceteris bonis operibus charitatis.
41. Deve-se pregar com muita cautela sobre as indulgências apostólicas, para que o povo não as julgue erroneamente como preferíveis às demais boas obras do amor.[5] [5]
[42] Docendi sunt christiani, quod Pape mens non est, redemptionem veniarum ulla ex parte comparandam esse operibus misericordie.
42. Deve-se ensinar aos cristãos que não é pensamento do papa que a compra de indulgências possa, de alguma forma, ser comparada com as obras de misericórdia.
[43] Docendi sunt christiani, quod dans pauperi aut mutuans egenti melius facit quam si venias redimereet.
43. Deve-se ensinar aos cristãos que, dando ao pobre ou emprestando ao necessitado, procedem melhor do que se comprassem indulgências.[6] [6]
[44] Quia per opus charitatis crescit charitas et fit homo melior, sed per venias non fit melior sed tantummodo a pena liberior.
44. Ocorre que através da obra de amor cresce o amor e a pessoa se torna melhor, ao passo que com as indulgências ela não se torna melhor, mas apenas mais livre da pena.
[45] Docendi sunt christiani, quod, qui videt egenum et neglecto eo dat pro veniis, non idulgentias Pape sed indignationem dei sibi vendicat.
45. Deve-se ensinar aos cristãos que quem vê um carente e o negligencia para gastar com indulgências obtém para si não as indulgências do papa, mas a ira de Deus.
[46] Docendi sunt christiani, quod nisi superfluis abundent necessaria tenentur domui sue retinere et nequaquam propter venias effundere.
46. Deve-se ensinar aos cristãos que, se não tiverem bens em abundância, devem conservar o que é necessário para sua casa e de forma alguma desperdiçar dinheiro com indulgência.
[47] Docendi sunt christiani, quod redemptio veniarum est libera, non precepta.
47. Deve-se ensinar aos cristãos que a compra de indulgências é livre e não constitui obrigação.
[48] Docendi sunt christiani, quod Papa sicut magis eget ita  magis optat in veniis dandis pro se devotam orationem quam promptam pecuniam.
48. Deve ensinar-se aos cristãos que, ao conceder perdões, o papa tem mais desejo (assim como tem mais necessidade) de oração devota em seu favor do que do dinheiro que se está pronto a pagar.
[49] Docendi sunt christiani, quod venie Pape sunt utiles, si  non in cas confidant, Sed nocentissime, si timorem dei per eas amittant.
49. Deve-se ensinar aos cristãos que as indulgências do papa são úteis se não depositam sua confiança nelas, porém, extremamente prejudiciais se perdem o temor de Deus por causa delas.
[50] Docendi sunt christiani, quod si Papa nosset exactiones venialium predicatorum, mallet Basilicam s. Petri in cineres ire quam edificari cute, carne et ossibus ovium suarum.
50. Deve-se ensinar aos cristãos que, se o papa soubesse das exações dos pregadores de indulgências, preferiria reduzir a cinzas a Basílica de S. Pedro a edificá-la com a pele, a carne e os ossos de suas ovelhas.
[51] Docendi sunt christiani, quod Papa sicut debet ita vellet, etiam vendita (si opus sit) Basilicam s. Petri, de suis pecuniis dare illis, a quorum plurimis quidam concionatores veniarum pecuniam eliciunt.
51. Deve-se ensinar aos cristãos que o papa estaria disposto – como é seu dever – a dar do seu dinheiro àqueles muitos de quem alguns pregadores de indulgências extorquem ardilosamente o dinheiro, mesmo que para isto fosse necessário vender a Basílica de S. Pedro.
[52] Vana est fiducia salutis per literas veniarum, etiam si Commissarius, immo Papa ipse suam animam pro illis impigneraret.
52. Vã é a confiança na salvação por meio de cartas de indulgências, mesmo que o comissário ou até mesmo o próprio papa desse sua alma como garantia pelas mesmas.
[53] Hostes Christi et Pape sunt ii, qui propter venias predicandas verbum dei in aliis ecclesiis penitus silere iubent.
53. São inimigos de Cristo e do Papa aqueles que, por causa da pregação de indulgências, fazem calar por inteiro a palavra de Deus nas demais igrejas.
[54] Iniuria fit verbo dei, dum in eodem sermone equale vel longius tempus impenditur veniis quam illi.
54. Ofende-se a palavra de Deus quando, em um mesmo sermão, se dedica tanto ou mais tempo às indulgências do que a ela.
[55] Mens Pape necessario est, quod, si venie (quod minimum est) una campana, unis pompis et ceremoniis celebrantur, Euangelium (quod maximum est) centum campanis, centum pompis, centum ceremoniis predicetur.
55. A atitude do Papa necessariamente é: se as indulgências (que são o menos importante) são celebradas com um toque de sino, uma procissão e uma cerimônia, o Evangelho (que é o mais importante) deve ser anunciado com uma centena de sinos, procissões e cerimônias.
[56] Thesauri ecclesie, unde Pape dat indulgentias, neque satis nominati sunt neque cogniti apud populum Christi.
56. Os tesouros da Igreja, a partir dos quais o papa concede as indulgências, não são suficientemente mencionados nem conhecidos entre o povo de Cristo.
[57] Temporales certe non esse patet, quod non tam facile eos profundunt, sed tantummodo colligunt multi  concionatorum.
57. É evidente que eles, certamente, não são de natureza temporal, visto que muitos pregadores não os distribuem tão facilmente, mas apenas os ajuntam.
[58] Nec sunt merita Christi et sanctorum, quia hec semper sine Papa operantur gratiam hominis interioris et crucem, mortem infernumque exterioris.
58. Eles tampouco são os méritos de Cristo e dos santos, pois estes sempre operam, sem o papa, a graça do ser humano interior e a cruz, a morte e o inferno do ser humano exterior.
[59] Thesauros ecclesie s. Laurentius dixit esse pauperes ecclesie, sed locutus est usu vocabuli suo tempore.
59. S. Lourenço disse que os pobres da Igreja são os tesouros da mesma, empregando, no entanto, a palavra como era usada em sua época.
[60] Sine temeritate dicimusclaves ecclesie (merito Christi donatas) esse thesaurum istum.
60. É sem temeridade que dizemos que as chaves da Igreja, que foram proporcionadas pelo mérito de Cristo, constituem estes tesouros.
[61] Clarum est enim, quod ad remissionem penarum et casuum sola sufficit potestas Pape.
61. Pois está claro que, para a remissão das penas e dos casos especiais, o poder do papa por si só é suficiente.[7] [7]
[62] Verus thesaurus ecclesie est sacrosanctum euangelium glorie et gratie dei.
62. O verdadeiro tesouro da Igreja é o santíssimo Evangelho da glória e da graça de Deus.
[63] Hic autem est merito odiosissimus, quia ex primis facit novissimos.
63. Mas este tesouro é certamente o mais odiado, pois faz com que os primeiros sejam os últimos.
[64] Thesaurus autem indulgentiarum merito est gratissimus,  quia ex novissimis facit primos.
64. Em contrapartida, o tesouro das indulgências é certamente o mais benquisto, pois faz dos últimos os primeiros.
[65] Igitur thesauri Euangelici rhetia sunt, quibus olim piscabantur viros divitiarum.
65. Portanto, os tesouros do Evangelho são as redes com que outrora se pescavam homens possuidores de riquezas.
[66] Thesauri indulgentiarum rhetia sunt, quibus nunc piscantur divitias virorum.
66. Os tesouros das indulgências, por sua vez, são as redes com que hoje se pesca a riqueza dos homens.
[67] Indulgentie, quas concionatores vociferantur maximas  gratias, intelliguntur vere tales quoad questum promovendum.
67. As indulgências apregoadas pelos seus vendedores como as maiores graças realmente podem ser entendidas como tais, na medida em que dão boa renda.
[68] Sunt tamen re vera minime ad gratiam dei et crucis pietatem comparate.
68. Entretanto, na verdade, elas são as graças mais ínfimas em comparação com a graça de Deus e a piedade da cruz.
[69] Tenentur Episcopi et Curati veniarum apostolicarum Commissarios cum omni reverentia admittere.
69. Os bispos e curas têm a obrigação de admitir com toda a reverência os comissários de indulgências apostólicas.
[70] Sed magis tenentur omnibus oculis intendere, omnibus auribus advertere, ne pro commissione Pape sua illi somnia predicent.
70. Têm, porém, a obrigação ainda maior de observar com os dois olhos e atentar com ambos os ouvidos para que esses comissários não preguem os seus próprios sonhos em lugar do que lhes foi incumbidos pelo papa.
[71] Contra veniarum apostolicarum veritatem qui loquitur, sit ille anathema et maledictus.
71. Seja excomungado e amaldiçoado quem falar contra a verdade das indulgências apostólicas.
[72] Qui vero, contra libidinem ac licentiam verborum Concionatoris veniarum curam agit, sit ille benedictus.
72. Seja bendito, porém, quem ficar alerta contra a devassidão e licenciosidade das palavras de um pregador de indulgências.
[73] Sicut Papa iuste fulminat eos, qui in fraudem negocii veniarum quacunque arte machinantur.
73. Assim como o papa, com razão, fulmina aqueles que, de qualquer forma, procuram defraudar o comércio de indulgências,
[74] Multomagnis fulminare intendit eos, qui per veniarum pretextum in fraudem sancte charitatis et veritatis machinantur.
74. muito mais deseja fulminar aqueles que, a pretexto das indulgências, procuram fraudar a santa caridade e verdade.
[75] Opinari venias papales tantas esse, ut solvere possint hominem, etiam si quis per impossibile dei genitricem violasset, Est insanire.
75. A opinião de que as indulgências papais são tão eficazes a ponto de poderem absolver um homem mesmo que tivesse violentado a mãe de Deus, caso isso fosse possível, é loucura.
[76] Dicimus contra, quod venie papales nec minimum venialium peccatorum tollere possint quo ad culpam.
76. Afirmamos, pelo contrário, que as indulgências papais não podem anular sequer o menor dos pecados venais no que se refere à sua culpa.
[77] Quod dicitur, nec si s. Petrus modo Papa esset maiores gratias donare posset, est blasphemia in sanctum Petrum et Papam.
77. A afirmação de que nem mesmo São Pedro, caso fosse o papa atualmente, poderia conceder maiores graças é blasfêmia contra São Pedro e o Papa.
[78] Dicimus contra, quod etiam iste et quilibet papa maiores habet, scilicet Euangelium, virtutes, gratias, curationum &c. ut 1.Co.XII.
78. Dizemos contra isto que qualquer papa, mesmo São Pedro, tem maiores graças que essas, a saber, o Evangelho, as virtudes, as graças da administração (ou da cura), etc., como está escrito em I.Coríntios XII.
[79] Dicere, Crucem armis papalibus insigniter erectam cruci Christi equivalere, blasphemia est.
79. É blasfêmia dizer que a cruz com as armas do papa, insigneamente erguida, equivale à cruz de Cristo.
[80] Rationem reddent Episcopi, Curati et Theologi, Qui tales sermones in populum licere sinunt.
80. Terão que prestar contas os bispos, curas e teólogos que permitem que semelhantes sermões sejam difundidos entre o povo.
[81] Facit hec licentiosa veniarum predicatio, ut nec reverentiam Pape facile sit etiam doctis viris redimere a calumniis aut certe argutis questionibus laicorm.
81. Essa licenciosa pregação de indulgências faz com que não seja fácil nem para os homens doutos defender a dignidade do papa contra calúnias ou questões, sem dúvida argutas, dos leigos.
[82] Scilicet. Cur Papa non evacuat purgatorium propter sanctissimam charitatem et summam animarum necessitatem ut causam omnium iustissimam, Si infinitas animas redimit propter pecuniam funestissimam ad structuram Basilice ut causam levissimam?
82. Por exemplo: Por que o papa não esvazia o purgatório por causa do santíssimo amor e da extrema necessidade das almas – o que seria a mais justa de todas as causas –, se redime um número infinito de almas por causa do funestíssimo dinheiro para a construção da basílica – que é uma causa tão insignificante?
[83] Item. Cur permanent exequie et anniversaria defunctorum et non reddit aut recipi permittit beneficia pro illis instituta, cum iam sit iniuria pro redemptis orare?
83. Do mesmo modo: Por que se mantêm as exéquias e os aniversários dos falecidos e por que ele não restitui ou permite que se recebam de volta as doações efetuadas em favor deles, visto que já não é justo orar pelos redimidos?
[84] Item. Que illa nova pietas Dei et Pape, quod impio et inimico propter pecuniam concedunt animam piam et amicam dei redimere, Et tamen propter necessitatem ipsius met pie et dilecte anime non redimunt eam gratuita charitate?
84. Do mesmo modo: Que nova piedade de Deus e do papa é essa que, por causa do dinheiro, permite ao ímpio e inimigo redimir uma alma piedosa e amiga de Deus, mas não a redime por causa da necessidade da mesma alma piedosa e dileta por amor gratuito?
[85] Item. Cur Canones penitentiales re ipsa et non usu iam diu in semet abrogati et mortui adhuc tamen pecuniis redimuntur per concessionem indulgentiarum tanquam vivacissimi?
85. Do mesmo modo: Por que os cânones penitenciais – de fato e por desuso já há muito revogados e mortos – ainda assim são redimidos com dinheiro, pela concessão de indulgências, como se ainda estivessem em pleno vigor?
[86] Item. Cur Papa, cuius opes hodie sunt opulentissimis Crassis crassiores, non de suis pecuniis magis quam pauperum fidelium struit unam tantummodo Basilicam sancti Petri?
86. Do mesmo modo: Por que o papa, cuja fortuna hoje é maior do que a dos ricos mais crassos, não constrói com seu próprio dinheiro ao menos esta uma basílica de São Pedro, ao invés de fazê-lo com o dinheiro dos pobres fiéis?
[87] Item. Quid remittit aut participat Papa iis, qui per contritionem perfectam ius habent plenarie remissionis et participationis?
87. Do mesmo modo: O que é que o papa perdoa e concede àqueles que, pela contrição perfeita, têm direito à plena remissão e participação?
[88] Item. Quid adderetur ecclesie boni maioris, Si Papa, sicut semel facit, ita centies in die cuilibet fidelium has remissiones et participationes tribueret?
88. Do mesmo modo: Que benefício maior se poderia proporcionar à Igreja do que se o papa, assim como agora o faz uma vez, da mesma forma concedesse essas remissões e participações cem vezes ao dia a qualquer dos fiéis?
[89] Ex quo Papa salutem querit animarum per venias magis quam pecunias, Cur suspendit literas et venias iam olim concessas, cum sint eque efficaces?
89. Já que, com as indulgências, o papa procura mais a salvação das almas do que o dinheiro, por que suspende as cartas e indulgências, outrora já concedidas, se são igualmente eficazes?
[90] Hec scrupulosissima laicorum argumenta sola potestate compescere nec reddita ratione diluere, Est ecclesiam et Papam hostibus ridendos exponere et infelices christianos facere.
90. Reprimir esses argumentos muito perspicazes dos leigos somente pela força, sem refutá-los apresentando razões, significa expor a Igreja e o papa à zombaria dos inimigos e fazer os cristãos infelizes.
[91] Si ergo venie secundum spiritum et mentem Pape predicarentur, facile illa omnia solverentur, immo non essent.
91. Se, portanto, as indulgências fossem pregadas em conformidade com o espírito e a opinião do papa, todas essas objeções poderiam ser facilmente respondidas e nem mesmo teriam surgido.
[92] Valeant itaque omnes illi prophete, qui dicunt populo Christi “Pax pax”, et non est pax.
92. Portanto, fora com todos esses profetas que dizem ao povo de Cristo "Paz, paz!" sem que haja paz! 
[93] Bene agant omnes illi prophete, qui dicunt populo Christi “Crux crux”, et non est crux.
93. Que prosperem todos os profetas que dizem ao povo de Cristo "Cruz! Cruz!" sem que haja cruz![8] [8]
[94] Exhortandi sunt Christiani, ut caput suum Christum per penas, mortes infernosque sequi studeant,
94. Devem-se exortar os cristãos a que se esforcem por seguir a Cristo, seu cabeça, através das penas, da morte e do inferno.
[95] Ac sic magis per multas tribulationes intrare celum quam per securitatem pacis confidant.
95. E que confiem entrar no céu antes passando por muitas tribulações do que por meio da confiança da paz.
M.D.Xvii.
[1517 A.D.]

 
 Martinho Lutero (Marthin Luther) nasceu na Alemanha, àquela época uma nação dividada em inúmeros principados e ducados, a 10 de novembro de 1483, na cidade de Eisleben, Turíngia, centro da Alemanha. Seus pais chamavam-se João (Johann) e Margarida (Gretchen) e eram relativmente pobres - João era mineiro e lenhador -, mas possuiam a riqueza da instrução e sensibilidade religiosa. Johann sabia ler e escrever e desde cedo se ocupou em dar uma boa educação do filho Marthin. Em 1484, a família muda-se para a cidade de Mansfeld, onde Martinho iniciou seus estudos, demonstrando, aos poucos, possuir uma inteligência fina e arguta. Dando continuidade a seus estudos, Martinho deixou a casa paterna e ingressou na escola superior de Magdeburgo, antes dos 15 anos. Depois de um ano ali, teve que retornar à casa dos pais acometido que foi de grave enfermidade, indo por esta razão, no ano seguinte, estudar em Eisenach. Três anos cursou o colégio de Eisenach. Em 1501 ingressava na Universidade de Erfurt, cidade conhecida como "Roma Alemã" pelo número de suas igrejas e mosteiros. Obteve ali os graus de Bacharel (1502) e Mestre em Arte (1505). No mesmo ano ingressou no curso de Direito.
Tudo indicava que Lutero faria carreira na vida pública ou acadêmica e, apesar de seu zelo e respeito para com a Religião (ele era um Católico Convicto, até por que não havia mesmo outras vertentes cristãs à época), nada diria que iria, de fato, um dia se dedicar seriamente a assuntos religiosos. Mas um incidente o faria mudar de idéia. Em 02 de julho de 1505, regressando da casa paterna para a Faculdade, teve sua vida seriamente ameaçada por uma tempestade que, por pouco, quase lhe tirara a vida. A emergência da situação o levou a fazer, nesta oportunidade, um voto a Sant’ana que, se lhe fosse dado viver, ingressaria no mosteiro para tornar-se monge. No dia 17 de julho de 1505 cumpriu a promessa adentrando pelas portas do convento da Ordem dos Agostinhos.

Disciplinado e dado aos estudos, Lutero foi ordenado sacerdote em 1507. Porém, quanto mais se dedicada à tarefa intelectual sobre os livros de Teologia, maior crescia sua angústia. Para ele, as palavras dos doutores eram complicadas demais, rebuscadas demais e, diante da poesia dos Evangelhos, na verdade pareciam mais levar a um escurecimento da mente do que a iluminá-la diante de tantos ornamentos e armadilhas argumentativas da Escolástica Medieval. Por esta época o Renascimento já trazia um ar novo e um espírito de Liberdade na egreógra intelectual Italiana e alguns dos pensamentos humanistas já atingiam a Alemanha. Lutero entrava em conflito diante da necessidade do crescimento humano e as regras duras de Salvação que eram estabelecidas pela Igreja Tradicional (este conflito, porém, nunca esteve realmente resolvido em Lutero. Em alguns pontos de sua Doutrina, infelizmente, ele ainda adotaria uma postura rígida, estabelecendo que o Destino da Alma dependia unicamente da Fé, muito mais que das obras feitas pelos homens...).

Segundo a biografia de Lutero publicada em "O Mensageiro Luterano", por indicação do vigário da ordem de Santo Agostinho, João de Staupitz, Lutero foi designado professor na Universidade de Wittenberg, fundada em 1502 por Frederico, o Sábio, duque da Saxônia e presidente dos sete eleitores civis que, juntamente com sete autoridades religiosas, elegiam o imperador do Sacro Império-Romano da Nação Alemã. Nesta Universudade, Martinho ocupou brilhantemente a cátedra de Teologia. Aprofundou-se em seus também seus estudos das línguas, instruindo-se principalmente no gregos e hebráico, repetindo quase que a mesma carreira de São Gerônimo e, em 09 de março de 1509, obteve o grau de Baccalaureus Biblicus.

Um dos mais brilhantes teólogos da Alemanha, país este mais disciplinado na formação do caráter religioso que os demais, em 1511, Lutero foi escolhido, aos 28 anos, para ser enviado em missão diplomática a Roma. Ao entrar en contato, porém, com a Sede da Igreja, sua decepção foi terrível. Se querem ter uma idéia do que era a sociedade romana da época, leiam o "Decameron", de Boccacio. A corrupção, imoralidade, as zombarias, o desrespeito do clero e da cúpula da igreja para com as coisas sagradas marcaram nele uma profunda desilusão. Em tudo e por tudo, os interesses da clero eram mais mundandos que espirituais. Grandes somas de dinheiro eram obtidas de toda a Europa para financiar as vaidosas construções papais, e muito esforço era dispendido para ter o total controle do pensamento intelectual, já que pensamento do Renascimento parecia questionar pontos básicos da doutrina da Igreja e deslocava aos poucos a ênfase do pensamento da Teologia endurecida de Roma para um foco mais humanista. Embora profundamente entristecido, diante das picuinhas da igreja de Roma, Lutero não deixou de crer em seus princípios.

Em outubro de 1512, Lutero recebia o grau de Doutor em Teologia. Assumiu, a seguir, a cadeira de Lectura in Bíblia lecionando o hebraico do Antigo Testamento e o grego do Novo Testamento, incorporando conquistas do humanismo na ciência da interpretação de textos. Ainda em 1512, foi eleito subprior do convento de Wittenberg. Em maio de 1515, o cabido geral reunido em Gotha o designava vigário do distrito, que compreendia onze conventos sob sua orientação e autoridade. As suas preleções eram tão concorridas que a elas acorriam estudantes de todas as partes e países vizinhos. Os professores assistentes também aumentavam. Ocupando o púlpito, a capela logo não mais podia comportar os assistentes. O senado o convidou então a ocupar a igreja paroquial da cidade. Nestes debates, Lutero começou a discutir o papel da Igreja na chamada "Venda de Indulgência" (que, por estranho que seja, se foi o início do movimento das Reformas na Igreja, hoje é uma das características da Igrejas Evangélicas no Brasil, em especial as de linha calvinistas vinda dos Estados Unidos e da IURD, Igreja Universal do Reinod de Deus. Mas estas vertentes evangélicas têm muito pouco a ver com a Igreja Reformada de Lutero).

Lutero se irritava com o aspecto comercial e, em seu ponto vista ilógico, absurdo, da Igreja no sentido de se vender a paz de espírito e um lugar no Céu através das "Cartas de Indugência", vendas essas que financiavam a construção da Igreja de São Pedro, em Roma, e enriqueciam o clero.

Em 1517, Lutero não aguentava mais este comércio e quis provocar um debate público sobre a venda de indulgências promovidas pelo Papa Leão X e o arcebispo Alberto de Mogúncia através da Ordem dos Dominicanos. Quando pregou à porta da Igreja do Castelo de Wittenberg, em 31 de outubro de 1517, o pergaminho com as 95 teses em latim para serem debatidas entre os acadêmicos, conforme o costume da época, Lutero estava ainda longe de acreditar que seu ato iria desencadear um movimento revolucionário na história da igreja. El era apenas o pároco que, preocupado, via como as almas dos fiéis eram desnorteadas por um grande escândalo, descaradamente apregoado em nome da santa Igreja: a venda do perdão de Deus, como se fosse mercadoria, por meio de cartas de indulgência. Estas são algumas das teses apresentadas por Lutero: - Dizendo nosso Senhor e Mestre Jesus Cristo: Arrependei-vos... etc., pretendia falar da vida interior do cristão que deveria ser um contínuo e ininterrupto arrependimento (Tese I) - Pregam futilidades humanas quantos alegam que no momento em que a moeda soa ao cair na caixa a alma se vai do purgatório (Tese 27) - Todo o cristão que se arrepende verdadeiramente dos seus pecados e sente pesar por ter pecado, tem pleno perdão da pena e da dívida, perdão esse que lhe
pertence mesmo sem compra de indulgência (Tese 36) - Esperar ser salvo mediante breves de indulgência é vaidade e mentira, mesmo se o comissário de indulgências e o próprio papa oferecessem sua alma como
garantia (Tese 52).

A Reação de Roma, como era de se esperar, foi violenta. Lutero foi chamado para responder processo em Roma, dentro de sessenta dias. Mas, por interferência de Frederico, o Sábio, Príncipe da Saxônia, o Papa consentiu que a questão fosse tratada em Augsburgo, pelo Cardeal Cajetano. Este exigia simplesmente que Lutero se retratasse, o que este, naturalmente, não fez. Tinha Lutero nessa época o apoio do capítulo da Ordem dos Agostinhos e do corpo docente da Universidade de Wittenberg. A Alemanha, enfim, tinha toda uma percepção ética que apoiava a maior parte das teses de Lutero afixadas em Wittenberg.

O Papa temia, com razão, que este moviemento viesse a construir uma oposição cerrada contra Roma entre os príncipes alemães. Era necessário usar alguma tática que lhe permitiesse resolver a questão sem ferir a vaidade dos políticos envolvidos. Assim, espertamente, condecorou o protetor de Lutero, Frederico, o Sábio, com a "Ordem da Rosa Áurea da Virtude" e enviou o conselheiro Karl von Miltitz que conseguiu que Lutero escrevesse uma carta ao papa, declarando sua fiel submissão; mas reafirmou, também, sua doutrina da justificação pela fé somente, sem os méritos de obras (um dos pontos de sua doutrina que eu mesmo acho exagerado). Expôs e defendeu sua posição num debate com o Dr. João Eck em Leipzig. O que precipitou o rumo das coisas foi sua declaração de que nem todas as doutrinas de João Huss (queimado como herege em Constança, em 1415) eram falsas, e que os concílios são passíveis de erros em suas decisões. Isto o colocou à margem da igreja papal, que se fundamentava sobre a infalibilidade do papa e dos concílios.
A resposta do Papa foi a bula de excomunhão Exsurge Domine. Ela ainda dava 60 dias para Lutero retratar-se do que havia escrito e ensinado. Lutero, apesar da angústia, manteve-se firme e, em 03 de janeiro de 1521, esgotou-se o prazo dado na bula, sendo então proferido o anátema definitivo, pela bula Decet Romanum Pontificem.
Em 1521 houve a primeira Assembléia do Sacro Império, presidida pelo jovem imperador Carlos V, eleito em 1520, em sucessão a Maximiliano, para dirigir o reino "em que o sol não se punha". Lutero, intimado, compareceu diante da assembléia em de abril de 1521. Perguntado se renunciava ao que tinha escrito, respondeu: "Não posso, nem quero retratar-me, a menos que seja convencido do erro por meio da palavra bíblica ou por outros argumentos claros. Aqui estou; não posso de outra maneira! Que Deus me ajude. Amém".

Proscrito pelo imperador, Lutero corria sério risco de vida, mas foi posto em segurança pelo duque Frederico, através de um seqüestro simulado durante sua viagem de retomo, e escondido no Castelo de Wartburgo, nas proximidades de Eisenach. Sua principal realização nesse período foi a tradução do Novo Testamento grego para um alemão fluente de grande aceitação popular. Segundo cosnta, os primeiros 5 mil exemplares esgotaram-se em 3 meses. Em cerca de dez anos houve 58 edições. Em 1522, ainda com risco de vida, reassumiu as funções de professor em Wittenberg. Juntamente com Felipe Melanchthon cognominado Praeceptor Germaniae - educador da Alemanha), seu grande amigo e colaborador, instruiu centenas de estudantes alemães, boêmios, poloneses, finlandeses, escandinavos. Por esta época também estabeleceu o catecismo básico luterano e os rituais da Igreja, muitos foram adaptações do ritual romano. Em vários pontos, Lutero apenas fez o que se propôs, reformou a Igreja de modo a que se fizesse mais transparente à mensagem do Cristo, mantendo os ritos e símbolos que ajudavam a meditação dos fieis e estimulavam uma interiorização da alma. Assim, a comunhão era feita realmente com pão comum e vinho. Os vitrais permaneceram e, com excessão do crucifixo, a adoção de outras imagens era facultativa. A arte era exaltada, em especial a música (lutero mesmo era bom compositor e deixou vários belíssimos hinos) e era dado muita ênfase à educação intelectual dos fieis, em especial por meio da Teologia, Filosofia e Ciências. Apesar de haver pessoas com a função de conduzir os cultos e reuniões da assembléia, Lutero afirmava que todos tinham igual capacidade do entendimento íntimo de Deus e seus desígnios e cada um é responsável por seus atos, conforme a sua consciência. Sua posição firme e coerente lhe granjeou grande estima e em 1555, 9 anos após sua morte, a Paz de Augsburgo atendeu, de certa forma, aos reclamos dos evangélicos. Os príncipes e cidadãos do império respeitariam a filiaçao religiosa de cada um, e o povo teria a opção de adotar a confissão religiosa do respectivo domínio ou de emigrar a território que tivesse a confissão desejada.

Martinho Lutero faleceu aos 62 anos de idade, em 18 de fevereiro de 1546, em sua cidade natal, Eisleben, depois de solucionar um litígio entre os condes de Mansfeld. Com grande cortejo fúnebre e ao som de todos os sinos, Lutero foi sepultado sob as lajes da igreja do Castelo de Wittenberg, onde sempre pregava o evangelho e deu início ao processo de liberdade religiosa que iria abraçar todo o mundo.

Lutero dava preferência a certos estudos, dentre os quais se destacam a soberania de Deus, dando uma abordagem mais bíblica às questões religiosas e às doutrinas cristãs. Alguns pontos defendidos por Lutero são :

1 - nem o papa nem o padre, tem o poder de remover os castigos temporais de um pecador.
2 - a culpa pelo pecado não pode ser anulada por meio de indulgências.
3 - somente um autêntico arrependimento pode resolver a questão da culpa e do castigo, o que depende única e exclusivamente de Cristo.
4 - só há um Mediador entre Deus e os homens, o homem Jesus Cristo.
5 - não há autoridade especial no papa.
6 - as decisões dos concílios não são infalíveis.
7 - a Bíblia é a única autoridade de fé e prática para o cristão.
8 - a justificação é somente pela fé.
9 - a soberania de Deus é superior ao livre-arbítrio humano.
10 - defendia a doutrina da consubstanciação em detrimento da transubstanciação.
11 - há apenas dois sacramentos : o batismo e a ceia do Senhor.
12 - opunha-se a veneração dos santos, ao uso de imagens nas Igrejas, às doutrinas da missa e das penitências e ao uso de relíquias.
13 - contrário ao celibato clerical.
14 - defendia a separação entre igreja e estado.
15 - ensinava a total depravação da natureza humana.
16 - defendia o batismo infantil e a comunhão fechada.
17 - defendia a educação dos fiéis em escolas paroquianas.
18 - repudiava a hierarquia eclesiástica.
Cronologia Básica:
1483, 10 de novembro: Nasce Lutero.
1509: Henrique VIII(1491-1547) torna-se rei da Inglaterra. Nasce João Calvino em 10 de julho.
1517, 1.º de outubro: Lutero fixa as suas “95 Teses” na porta da Igreja do Castelo de Wittenberg.
1518: Lutero recusa-se a retratar-se perante o papa Leão X(1475-1521; pontificado: 1513-1521).
1520, junho: Leão X condena 41 proposições de Lutero.
1521, 21 de janeiro: Leão X excomunga Lutero, mas leva vários meses até a ordem de excomunhão chegar à Alemanha.
1522: Lutero publica a sua advertência contra os distúrbios e publica a tradução do hebreu para o alemão do Novo Testamento, com gravuras de Lucas Kranach(1472-1553).
1523: Lutero publica texto que fala do direito de a comunidade de fiéis julgar toda a doutrina e nomear e demitir clérigos.
1524-1525: Guerra dos camponeses de Müntzer.
1525: Lutero publica texto contra os “profetas sagrados” e contra as “revoltas camponesas”.
1528: Mandato imperial ameaça de morte os anabatistas.
1530: Carlos I(1500-1558) – rei de Espanha desde 1516 e eleito imperador desde 1519 – fracassa em impor uma ortodoxia religiosa ao império.
1534: Ruptura de Henrique VIII da Inglaterra com Roma, supressão dos monastérios e concessão de permissão para os padres se casarem. Na Alemanha, Lutero publica a tradução do hebreu para o alemão do Velho Testamento.
1534-1535: Anabatistas tomam o poder em Münster, mas seu reino é derrubado por forças católicas e protestantes.
1536: Calvino edita “Instituições da Religião Cristã”. Há também a introdução da bíblia vernacular na Inglaterra.
1542: Calvino organiza o seu catecismo em Genebra.
1544: Calvino admoesta os anabatistas.
1545, 13 de dezembro: Começa o Concílio de Trento.
1546, 18 de fevereiro: Morre Lutero.
1547: Eduardo VI(1537-1553) assume o trono na Inglaterra e demonstra forte tendência calvinista.
1549: Eduardo VI lança o livro de pregações e pretende forçar a uniformidade religiosa em torno da fé reformada na Inglaterra.
1553: Morre Eduardo VI e sua irmã mais velha, Maria I(1516-1558), pretende o retorno da Inglaterra ao Catolicismo.
1558: Morre Carlos V da Espanha e Maria I da Inglaterra. Elizabeth (1533-1603) assume o trono da Inglaterra e tenta restaurar o anglicanismo de seu pai, Henrique VIII, o que significava evitar os extremos puritano(Eduardo VI) e católico(Maria I).
1560, Março: Fracasso de uma conspiração de jovens aristocratas huguenotes franceses contra a Casa Católica do Duque de Guise. Primeiro édito de tolerância é editado.
1561, Setembro-Novembro: Colóquio de Poissy, mas fracassa a tentativa de restaurar a unidade entre huguenotes e católicos na França.
1562, março: Massacre dos huguenotes em Vassy comandada pela Casa Católica de Guise. Primeira Guerra Civil Religiosa na França.
1563: Em março, Catarina de Médicis(1519-1589; regente: 1560-1674) tenta por fim à guerra civil francesa com a assinatura da Paz de Amboise, que concede certo grau de tolerância para os huguenotes. Neste mesmo ano, encerra-se o Concílio de Trento.
1564, 27 de maio: 
Morre João Calvino. Théodore de Béze(1519-605) sucede Calvino como líder da reforma protestante centrada em Genebra.


Fonte: www.adbacabal/curiosidades (Assembléia de Deus em Bacabal (MA)

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